segunda-feira, 19 de maio de 2008

Configuração do Discurso Tecnológico

RESUMO

Este artigo pretende mostrar como se constituiu o discurso tecnológico na sociedade da informação. E apresentar dois dos principais enunciados que evidenciam esse discurso o compondo e reforçando na sociedade.

Palavras-Chave: discurso tecnológico, sociedade da informação, inclusão digital, internet.


Introdução

Com a passagem da chamada Sociedade Industrial para o a Sociedade da Informação, no início dos anos 70, iniciou-se a construção da noção de Sociedade Digital. E como qualquer novo paradigma para se estabelecer foi se instaurando um novo discurso, que para se legitimar necessitou que sua ideologia fosse disseminada e apreendida. Na maioria das vezes isso acontece exacerbando qualidades do novo modelo, mesmo que isso se configure em uma utopia. E foi o que aconteceu com a chamada “Revolução Tecnológica”.

Como todo processo de transformação histórica, a era da informação não determina um curso único da história humana. Suas conseqüências, suas características dependem do poder de quem se beneficia em cada uma das múltiplas opções que se apresentam, conforme a vontade humana. Mas a ideologia tecnocrática futurológica tenta apresentar a revolução tecnológica como ditando uma única forma de organização social possível, geralmente associada à lei do mercado e ao processo de globalização. Desta forma, a aceitação do extraordinário caráter da revolução tecnológica em curso comportaria a aceitação, no essencial, da proposta segundo a qual a ciência e a tecnologia, utilizadas racionalmente, solucionarão os principais problemas da humanidade. Ainda reconhecendo obstáculos no processo de difusão e desenvolvimento, a crítica aos usos da tecnologia se identifica com a resistência obscurantista à mudança social. A ideologia da bondade tecnológica e a ideologia de uma globalização fundamentalmente orientada pela lei do mercado reforçam uma a outra. Em ambos os casos, desaparece a sociedade como processo autônomo de decisão em função dos interesses e valores de seus membros, submetidos a forças externas do mercado e à tecnologia. (CASTELLS, 2006, p. 225 e 226)

Ao analisar esse momento de apreensão do ‘discurso tecnológico’ Mattelart argumenta que o discurso enunciado produz o sentido de que a visão tecnicista a respeito das mudanças tecnológicas dificulta o entendimento dos avanços culturais inerentes ao caráter da informação entendida como novo “recurso intelectual”, novo “capital cognitivo”, pois essa noção foi introduzida em todos os setores da vida.

(...)a construção da chamada sociedade da informação se inscreve forçosamente em um campo de forças políticas das quais é difícil abstrair-se, e que os usos sociais das tecnologias são também assunto dos cidadãos e não só do determinismo do mercado e da técnica. (MATTELART, 2006, p. 237)


Dentre os vários discursos enunciados duas questões relevantes para o estabelecimento do discurso tecnológico surgem para fortalecê-lo. Ao mesmo tempo elas se constituem em dois dos enunciados mais recorrentes deste discurso e por isso serão descritas neste artigo. São as questões com relação a Inclusão Digital e a Internet, Liberdade e Vigilância. Neste trabalhos essas questões serão mostradas para assim identificar como elas corroboram e legitimam o discurso tecnológico.


1. Inclusão Digital
As mudanças históricas surgem de forma heterogênea e, muitas vezes, desigual. Em seus processos há muitas variáveis relevantes. No caso da revolução tecnológica há muitos fatores envolvidos. Dentre eles, pode-se destacar a questão que, ultimamente, tem sido enunciada de forma mais vidente: a Inclusão Digital. Pode-se definir, de forma simples, que inclusão digital são as ações e políticas (sejam de iniciativa pública ou não) para democratizar o acesso às tecnologias da informação.
Como, atesta Casttels (2006), foi em meio a uma das revoluções tecnológicas mais extraordinárias da história que a disparidade conhecimento e capacidade científica se concentra cada vez mais, seja isso evidente na diferença de avanço tecnológico entre países, classes, instituições e organizações.
Em particular no caso do Brasil para Miranda e Mendonça (2006) a exclusão digital é um fenômeno complexo e de várias dimensões. Sendo que apenas o incentivar ao desenvolvimento tecnológico não é suficiente para superá-la. É necessário também incentivar a democratização da informação, ampliando o acesso dos indivíduos a produção e divulgação do conhecimento, além da melhoria na distribuição de renda.

(...) “A falta de acesso à informação e às tecnologias, assim como aos serviços e direitos cidadãos, deve ser uma preocupação constante dos governos no momento de pensar, planejar e instituir políticas e programas de inclusão social e combate à pobreza. (...) [Que] não se caracteriza somente pela falta de acesso à educação, à saúde, à habitação, à participação social, aos direitos humanos e às tecnologias de informação e comunicação.
Portanto, há de se considerar à importância à democratização do acesso às informações mediadas pelas tecnologias de informação, educação e comunicação como um capital fundamental no combate à exclusão digital, à pobreza e à ampliação dos direitos do cidadão. (MIRANDA e MENDONÇA, 2006, P. 54)

Neste sentido tem-se que considerar que o avanço tecnológico tem afetado não só as condições culturais como também as relações de trabalho, a oferta de novos postos de produção e a extinção de tantos outros, estar excluídos desses processos por causa do desconhecimento ou da não-utilização condena o indivíduo à miséria permanente. (MIRANDA e MENDONÇA, 2006)
Por tudo isso, para Miranda e Mendonça (2006), investir na inclusão digital, portanto, não significa apenas alfabetizar tecnologicamente os indivíduos, as famílias e a comunidades, mas também inserir conteúdos, avaliar seus processos de recepção e medição, tendo como finalidade a aplicação social desses conteúdos trabalhados.

2. Internet: Liberdade e Vigilância
Outra questão recorrente no discurso da Sociedade da Informação são os enunciados sobre a Internet como espaço livre. Castells até diz que ela é uma das “tecnologias da liberdade”. Já Mattelart é mais crítico com relação a esse discurso que envolve a internet e liberdade.

(....) A conectividade técnica é apresentada como o passaporte à nova sociedade. Esta ideologia da conectividade combina com o retorno, nas esferas do chamado poder global, das concepções neodifusionistas – de cima pra baixo – de produção e distribuição do “conhecimento” nas estratégias de construção dos macrousos das novas tecnologias da informação e da comunicação. A retórica da inovação digital serve de pretexto para revigorar visões neo-imperiais e etnocêntricas da reestruturação da ordem mundial. (MATTELART, p. 238)

Neste contexto se estabelece outra questão interessante a respeito da liberdade da internet e de como ela pode ter seu uso sob vigilância. Castells revela que ao mesmo tempo em que há uma explosão das “tecnologias da liberdade” (conjunto de tecnologias informáticas de rede, de telecomunicações de banda larga, comunicação móvel e de computação dsitribuída) – particularmente a internet – eclode também a questão da vigilância dessa tecnologia. Segundo ele isso sobre o pretexto do terrorismo e pornografia. Ele analisa que este é um momento de obsessão pela segurança, do controle dos Estados sobre as comunicações, da ameaça à liberdade de expressão, dentro e fora da Internet, da vigilância eletrônica ubíqua e da invasão sistemática da privacidade por parte de empresas comerciais e agências do governo. (CASTELLS, 2006)
A vigilância é possível, segundo Castells (2006), porque a internet foi arquitetada para dificultar seu controle, mas não a vigilância da mensagem. E mesmo sofrendo cada vez mais interferência ainda se constitui no meio de comunicação local-global mais livre.

E apesar das contínuas tentativas de comercializar a Internet, apesar de ter se convertido em um instrumento essencial para a atividade econômica, a grande massa de fluxos de informação na Internet é de uso social e pessoal, não comercial. A Internet é fundamentalmente um espaço social, cada vez mais amplo e diversificado a partir das tecnologias de acesso móvel a ela. Por isso a preservação da liberdade de expressão e comunicação na Internet é a principal questão na liberdade de expressão em nosso mundo. (CASTELLS, 2006, p. 227)


Considerações Finais
O discurso tecnológico já está se constituindo num “verdadeiro da época” (fazendo alusão a Foucault), pois sua formação ideológica já perpassa por vários autores, entre os quais Castells e Mattelart. Ainda pode-se dizer que ele ainda se detém muito na questão da transmissão das mensagens (canal) e não na produção de sentidos que a tecnologia traz em si.
Esse discurso poderia se ampliar se a visão de que os avanços tecnológicos fossem apreendidos como inerentes as próprias mudanças culturais que estruturam a “Era da Informação” e dessa forma mostrar que fazem parte da intitulada “nova ordem mundial”.
Ao reverberarem tanto no discurso tecnológico, os dois enunciados mostrados (Inclusão Digital e a Internet, Liberdade e Vigilância) terminam por legitimar esse discurso, pois passam a fazer parte do cotidiano, se não de toda a sociedade, mas de parte dela.


BIBLIOGRAFIA

Castells, Manuel. Inovação, Liberdade e Poder na Era da Informação. In: Moraes, Denis de (org.). Sociedade Midiatizada. Rio de Janeiro: Mauad, 2006.
Mattelart, Armand. Para que “Nova Ordem Mundial da Informação”?. . In: Moraes, Denis de (org.). Sociedade Midiatizada. Rio de Janeiro: Mauad, 2006.Miranda, Antônio e Mendonça, Ana Valéria Machado. Informação e desenvolvimento em sociedade digital – Inclusão Social, Brasília, v.1, n.2, p. 53-57, abr./set. 2006

Um comentário:

Gustavo Henrique dos Santos disse...

Você deixou seus leitores anciosos pela estréia do seu Blog. Parabéns pelo texto. Espero que seu Blog seja um portal socio-digital daqui para frente, onde suas "digitais " estejam impressas nele.